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Tentando dar alguma razão à emoção do futebol

2 de jul. de 2006

Os quatro últimos serão os primeiros

escrito por Raphael Perret @ 20:58


Morde e assopra: Zidane, que pôs o Brasil na roda e no chão, consola Zé Roberto


Alemanha 1 x 1 Argentina (4 x 2 nos pênaltis)

Quanto mais a Copa se aproxima do final, mais os times têm medo. Se o adversário é uma força tradicional, então, espere um futebolzinho mixuruca, de toque pro lado, sem ousadia, com cautela demasiada, chances raras de gol e um tédio quase profundo.

Argentina e Alemanha decepcionaram quem esperava, pelo menos, um jogo vibrante, mesmo que não resultasse em um placar recheado. O primeiro tempo foi enfadonho. No segundo, Ayala marcou seu gol, e deu pelo menos a impressão de que haveria mais movimentação ao longo da partida.

A Alemanha foi pra cima, mas sem velocidade nem criatividade, arriscando os chutes de longe e os cruzamentos. O técnico argentino, José Pekerman, deu uma aula de como fazer péssimas substituições: tirou Riquelme, armador, e Crespo, centroavante e colocou Julio Cruz, um poste, e Cambiasso, um volante, deixando Saviola e Messi esquentando o banco. O castigo veio no gol de Klose, provável artilheiro do Mundial. A prorrogação apenas passou o tempo até os pênaltis, quando Ayala e Cambiasso mostraram que a disputa não é nada loteria: é competência mesmo. Ou falta dela, no caso dos dois jogadores.

A Argentina amarelou, porque tinha condições de aumentar o placar, não fosse a covardia de seu treinador. A Alemanha mostrou suas limitações ao enfrentar um time de melhor qualidade. Suas chances de ganhar aumentam por causa da inflamada torcida.

Itália 3 x 0 Ucrânia

Não vi o jogo direito. Me pareceu um passeio italiano pelos jogadores ucranianos. Uma defesa praticamente imbatível e um ataque competente. Convenhamos: tomar três gols da Itália é um atestado de inépcia futebolística. Como quem não quer nada, uma Itália sem grandes estrelas já está entre os quatro melhores do Mundial. E deve fazer uma semifinal bem interessante com a Alemanha. Afinal, a Azzurra sabe jogar recuada e investir em contra-ataques. É a principal aula de sua escola.

Inglaterra 0 x 0 Portugal (1 x 3 nos pênaltis)

Todos louvam Felipão, com sua razão. Ele injeta garra, ânimo, raça nos jogadores. Mas, definitivamente, os atletas não corresponderam na partida de quartas-de-final que classificou os lusitanos. O jogo estava amarrado até mais ou menos a metade do segundo tempo. Tipo Alemanha x Argentina. Então, o invocadinho Rooney dá um pisão numa região bem sensível de Ricardo Carvalho. É expulso e o técnico Sven Goran Eriksson tira o bom apoiador Joe Cole e coloca o grandalhão desengonçado Peter Crouch pra jogar sozinho no ataque. Era a chave para Portugal partir pra cima da Inglaterra e pressionar até o fim.

Entretanto, os portugueses não tiveram pernas. Daquele momento da expulsão até o final da prorrogação, Portugal chegava lentamente à área britânica, os atacantes pouco se movimentavam e os chutes saíam despretensiosos, distantes. Enquanto isso, quando era possível, a Inglaterra partia em corrida em direção ao gol de Ricardo, mas a solidão de Crouch não era suficiente pra fazer a bola chegar à meta, exceto em lances de bola parada que assustaram. Se o time inglês se classificasse, seria um ato de heroísmo e superação.

Vieram os pênaltis, nervos e músculos em frangalhos, várias cobranças perdidas, prevaleceu a estrela de Ricardo, que pegou três bolas.

Brasil 0 x 1 França

Zidane encarnou, em Frankfurt, todos os atributos que a maioria dos jogadores da seleção brasileira aparentava ter antes da Copa: idade avançada, talento único, velocidade, visão de jogo, precisão nos passes. No Mundial, o Brasil só apresentou mesmo a alta quilometragem, e só porque dela os atletas são indissociáveis. Todos brincavam com a aposentadoria de Zizou, mas ele mostrou que tem vários jogadores no Brasil que podiam aproveitar a despedida da Alemanha e se dirigir diretamente ao INSS mais próximo, enquanto ele exibe toda a sua categoria, aliás, questionada por muitos.

O francês guardou todo o seu repertório para, sem meias palavras, humilhar o Brasil. Deu lençol, deixou jogador no chão, puxou contra-ataques, fez lançamentos certeiros e, claro, deixou a bola aos pés de Thierry Henry, pela primeira vez em Copas, para que o jogador do Arsenal marcasse o gol que eliminou o Brasil. Zidane fez tudo com uma simplicidade impressionante, como se tivesse combinado com os jogadores adversários. Como conhecemos todo o seu talento, sabemos que as jogadas apresentadas foram fruto de seu talento, posto à máxima prova em toda a partida.

Os comentaristas de TV discutiam se Zidane merecia marcação especial ou não. O debate é inócuo. Não foi sua atuação nota 10 que desclassificou o Brasil. O Brasil é que se eliminou. A participação dos jogadores foi pífia, tirando os zagueiros, que cortaram um dobrado com a peneira do meio-campo brasileiro, e o goleiro Dida, sempre bem presente. A excelente marcação francesa não justifica a derrota. Ou o Brasil não tem jogadores geniais como Ronaldinho Gaúcho (uma decepção total, tímido, inoperante, presa fácil), Kaká (se estava meia-bomba, por que entrou como titular?) e Ronaldo (ao menos deixou sua marca nos jogos anteriores e chutou a gol), conhecidos por sua facilidade de penetração?
E o que dizer dos laterais Cafu e Roberto Carlos, que acertam um cruzamento de vez em quando, um chute a cada dez anos e, como se não bastasse, marcam mal (ou nem marcam, como fez o lateral-esquerdo no lance do gol)? E Parreira, que mexeu no time depois do gol francês, maduro desde o primeiro tempo? Por que mexeu no esquema tático tão drasticamente sem nunca tê-lo treinado antes, em vez de fazer as substituições que fizera contra o Japão, que ao menos já haviam sido testadas?

Listar os erros do Brasil no jogo e na Copa levaria muito tempo, luxo do qual não disponho agora. A última das falhas eu cito ao repetir a frase de Parreira, após a partida: "Admito que não estava preparado para sair nas quartas-de-final".

É isso. No mínimo, faltou humildade. Portanto, havia, sim, salto alto na seleção.

***

Alemanha, Itália, Portugal e França. Quatro seleções lutam por um título. Uma por bi, duas por tetra, uma pelo inédito. Quem tem mais chances?

A Alemanha é a resposta mais óbvia, pela torcida e pela dose de força conquistada na suada e dramática classificação por pênaltis.

A Itália, pra variar, tem a melhor defesa e seu único gol sofrido foi bisonhamente contra. Não é pouco. Além disso, o ataque tem sido eficiente nos contragolpes.

Portugal tem muita garra. O time supera suas deficiências com muita aplicação, embora isso não tenha ocorrido contra a Inglaterra, num jogo em que as condições lhe favoreciam.

A França ganhou moral e evoluiu muito ao longo do torneio. O time está unido, equilibradíssimo e Zidane voltou a brilhar. Se jogar assim na semifinal e numa eventual final e dar o título à sua seleção, entrará para a história ao ser o dono desta Copa.

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